quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Ano novo

Podem as paredes tombarem
e ser logo agora a hora má
de todos os sonhos bons?

Se digo sim, eu entro em brumas
que não me trazem as conchas
que as águas levam por debaixo
de meus pés salgados
Vislumbro o espesso nevoeiro;
promontório das dúvidas de granito
- vem o novo ano! vem o novo ano!

mas assim dizem todos os segundos
e dizem todos sem jamais desdizer
a ladainha que me trouxe até aqui
só para eu não te ter de volta
- vou sozinho embora

sábado, 8 de dezembro de 2012

Candlebright

Quando eu for me embora dessas paragens
deixarei um bilhete anônimo e esquecido
para um insolente deus com quem partilhei
o lado fresco e novo do travesseiro por todas
as noites do meu terceiro ano bissexto desde
a minha última conversão aos temperos indigestos
da moral e dos costumes revoltantes do que é hodierno

"Perdão, meu bom amigo de pragas e maldições,
mas você é minha oferenda ao grande diabo que
assombra a soleira de minha porta: afetaste teus ares
de bonachão por mais tempo do que devido.
Assino como aprendiz do erótico mais sutil que
me legaste na manhã da antevéspera"

Sempre quis pra mim, a alegria de sacrificar
um amante, por mais fantástico que o fosse,
a algo menor do que o sabor de um vento morno
na manhã de um dia que só prometa
o afago abafado de um sol em forno

Um outro homem

Que outro homem no mundo
que não seja meu pai?
que não seja um seu amigo,
que não lhe dispute a mulher
e, por que não, também o filho?

Um outro homem, sem a marca
indelével e eterna, pré-cambriana,
de um mundo o qual não o meu
jamais poderia ser?

Apenas um homem sem história
que eu jamais tenha visto
com um corpo para sempre intocado
inédito e por mim inexplorado
quem sabe, talvez, o meu filho?

Pequena dionisíaca

Quando eu sorri com o sangue de meu pai nas mãos
e as entranhas espalhadas no chão de minha mãe,
sorri fausto e pródigo, pois havia redimido esse
triste mundo de sujeiras burguesas e cantos abafados
dos meus ancestrais antepassados: quis matar
os homens ante-diluvianos, para melhor deitar
com os gigantes bíblicos de argila, extraviados,
como todos o sabem, com Ariadne em Naxos

II

Não confie na noite de quem vai embora
na ponta dos pés, sem levantar o pó

os dias conhecem os seus trabalhos todos
e o bom do amor fica apesar de um desenlace