domingo, 12 de junho de 2016

Pulso

Já está tarde e estamos tão longe, mas, tudo bem, que eu ainda posso te ligar. E aí já não estamos tão longe e até parece mais cedo, quando eu passei pra te dar um beijo antes de encontrar os meus amigos. Eu confesso que já estive mais confortável e, por alguma razão, eu só consigo pensar no quão cara estava aquela caipirinha. Não, não tem nada a se fazer. A caipirinha estava ruim e teria sido tão bom que ela houvesse sido melhor, sabe? Escuto uns barulhos de vez em quando. Tem gente do meu lado, mas nem nos olhamos - só quando fica muito silêncio e o coração aperta mais forte. Será que tem hora certa pra acontecer? Porque a derradeira mensagem terá uma hora certa e, mesmo assim, você jamais saberá quando foi exatamente e eu sinto que você precisaria saber até o último segundo quando foi que eu deixei de olhar pras letras das palavras que você me escrevia, assustada. Você nunca pensou que veria a morte assim. Bem, pelo menos, eu sei que eu nunca tinha. Pensei que, fosse como fosse, seria rápida e eu só teria que me arrepender do que eu nunca falei. Agora, eu vejo que não importa o que eu deixo de falar ou não. Nenhuma palavra, nenhuma fórmula é mágica e me deixa sair daqui. Eu só cultivo a expectativa, a de que eu podia sair pela porta a qualquer minuto e aparecer em casa, aí do seu lado, pra chorar o que já aconteceu e que vi com os meus olhos, quando eu ainda era gente e podia me preocupar com gente. Eu sequer consigo pensar que eu não quero morrer, porque eu só consigo pensar que eu vou morrer. E que a caipirinha estava muito ruim para ser a minha última. E que eu não tenho nada inteligente pra dizer, só que eu vou morrer. Eu vou morrer. Te amo, mamãe