quarta-feira, 23 de maio de 2012

Leito

Tivessem os grandes pensadores do mundo,
um pouco mais de malícia -
talvez, uma amante um tanto mais instigante -
teriam sabido desafiar nos homens
aquilo que lhes fazem crianças na noite

- Na cama, aguardam deleites e pesadelos
o problema não é que um leve ao outro
que porta não leva à outra porta -
diz quem sabe ver, suicida, pelos vidros -
mas sim, que será maior do que tudo
que já se viveu e se guardou num canto.

domingo, 6 de maio de 2012

Under the Ivy

Algo de jardim e flores - não me lembro. Mais que o bastante é a falta marcada no marfim das teclas que minhas palavras jamais tocam. E aí há você.
Quanto eu não sofri até lhe entender em todo seu espectro! Agora que sei - tudo isso vai embora? Meus escritos apócrifos se despem de todas as suas peles mortas e podem enfim rastejar livres?
Ah, por que amor e desamor são apenas pausas? Suspenso, eu adivinho os vértices das colunas que me sustentam a queda inibida. Um nó singelo que encompassa todos os nós de uma alma que vibra a cadência de muitos outros pequenos fogos-fátuos esquecidos do mundo outrora em névoa encoberto.
Há calma e não há gozo quando você se ausenta. Tenho que me guiar sem ser por esse prazer, pois acho que não te quererei nunca mais. Até que o nunca mais vem e eu nem me permito achar que pudesse não suspeitar disso.
Arcadas marcam em mármore todas as passagens. A cerca viva se retorce sob meus pés - talvez já eu não saiba do chão - mas o dia brilha em algum horizonte naufragado nesta ilha deserta. Desolado, sigo o caminho que os pés entorpecidos ditam às mãos ensanguentadas para perseverarem em conjunto. Rastejo com a graça certa de quem se livrou de um peso e aceita ser Sísifo em suas noites num soslaio anímico passível de repreensão por sua infantilidade.
Mas não se admoestam mais os perpetradores da invasão anterior ao tempo das rosas. O mar se ergue estanque sobre a minha cabeça e o sal é tudo que sente minha pele ardente pelo sol inclemente. Chove e ainda não acho aquela, das portas, a mais especial.
Secreto, insisto nos erros de sempre, nos erros de outrora, em toda a dança encorpada dos ritmos letárgicos de um ritual ancestral. Emerge, nas agruras dos presentes, o eco passado de geração à geração de refugiados perdidos das nuvens.
As nuvens encombrem o próprio mar a chover. Algum anjo meu faz nuvens o dia todo e eu o amo. Dito isso, sinto dissolver sob o abdômen fustigado pelas vinhas e espinhos do labirinto todo contato com alguma segurança que a dor me garantia até então. Eu já não sei mais para aonde eu vou depois daqui, depois de agora.
A ânsia, o espinho primordial, o parasita que desde sempre carreguei no peito, minha doença crônica, minha bronquite, meu soluço na meia noite - se me despeço é em pedaços apartados. Algo muda e tem que se continuar como quem muda de cores e oculta nas sombras do dia e da luz o que todos disfarçam pelo cotidiano de um olhar mais demorado. Demora, e tudo que eu tenho é tempo e pó para me erguer de novo.
Pó sobre as rosas sob os meus pés. Cheguei à câmara mais eterna e passei por debaixo da hera mágica - minha hejira derradeira, na qual derramo em ressaca a minha dor dormente.
Quiseram os músculos perderem nas carnes a cor, e os olhos, o brilho, tal qual o cabelo, o fulgor - mas havia ainda algo que resistiu por todo esse tempo... e sou criança de novo. Brinco no jardim, e tudo vai se acabando antes mesmo dos meus olhos se porem, à perda, contemplar. Tempo se esvai no vento e embalo no coração uma doce e cerrilhada melodia. Tudo me falta e vai se perdendo na rouquidão dos que gritam no silêncio opressor dos anos e das noites. Uma madrugada fatídica é o que falta para tudo se acabar de uma história que não se conta jamais em palavras. A esperança que resta aos meus sonhos é que eles escapem como gás de cozinha assassino pelo branco das curvas internas das letras que os ocultam aos lhes darem forma e sentido.
Plano mestre da música tácita do sexo. Ninguém daçou comigo que eu não pudesse esquecer frente ao seus olhos sem luz e matéria. Invisível, inantigível, você permanece um amor cúpido a tecer nas nuvens as mortalhas dos meus amores, enquanto eu lhe persigo, insígne, pelos recantos de um labirinto antigo, sem voltar às vistas a todas as pequenas maravilhas em volta. Por amor, elegi todo o mundo como aquilo que há de mais vulgar. Meu estandarte carrega a rosa branca de minha desistência frente à chuva que rasgará novamente as nuvens.