segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Lilás

E se olho para além das pontas dos meus dedos
e me deixo pesar o corpo até a queda,
reviro os olhos, revisto as órbitas de estrelas
e canto oco para ninguém,
faço da solidão um trono
e da dor uma espiral que me acende
e me tremula fantasmagórica flâmula.

Corta o mundo a minha voz
em gomos, cindindo da esfera a estática
como se de cristais partissem meus passos
e eu voasse a cada se-deslumbrar
porquê, às vezes, eu me esqueço de que ainda vivo,
tanto é o amor de uma coração a bater
que se pode esquecê-lo pelo além da vida
sem ele deixar de o ser sempre secreto
vértice delicado das asas

e fazer de uma paixão um balão a singrar o céu em chamas
e ver os mares, oh, mas tão aqui de cima
que se beberia as águas antigas que nunca choveram
e ter no toque das pontas da pele, mais que um sacrifício
mais que um rito, irrompe o grito, mais que um sacrifício
espirala o gérmen naturado nas alturas, mais que um rito
irrompe o grito, é sacrifício! Sim, é se perder e olhar para dentro
ter a casa na queda, no sem-lugar dos mundos desertos
 - há tão pouca vida que às vezes, eu espero que não faça mal
ter medo de acabá-la toda de um gole só
é tanta sede e tanto sal que não sei um homem dentro todos
que eu não olhe nos olhos um amor de fome e sangue

ah, mas é tanta a falta de tato, que eu recuo e me adivinho de onde eu jamais estarei
eu não estou aqui, que fica muito mais longe do que eu podia imaginar
quedo espelho em névoas e reflito nos poros as brumas
e pinto a pele esmagando com os pés as pétalas de liláses
e me deixo sentir o cheiro, para então sorvê-lo
- é medo, é me belo, é meu e é só
Sozinho no antes das primeiras chuvas, mas isso só vem muito depois de todo o resto,
até lá sofro o que não se sabe, como se valsasse a juventude numa aposta arriscada

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